Elas cuidam: 10 mulheres que mostram a força do protagonismo feminino na área da saúde

Médicas, enfermeiras e visionárias, elas dedicam a vida para cuidar do bem-estar de outras pessoas
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Divulgação

Por muito tempo, as áreas da saúde e da ciência foram dominadas pelos homens. No mundo medieval, parteiras e curandeiras até tentaram mostrar seu conhecimento intuitivo sobre o corpo humano ao mundo, mas muitas delas foram caçadas e classificadas como bruxas por falarem sobre uma sabedoria até então desconhecida. Foi só em 1847, em Geneva, na Suíça, que a primeira médica do mundo foi reconhecida como tal. Após ser recusada 12 vezes, Elizabeth Blackwell foi admitida na universidade Geneva Medical College e, embora tenha sido impedida de fazer demonstrações médicas em sala de aula por um tempo – prática considerada inadequada para uma mulher -, ela fez história e abriu as portas para que outras seguissem o caminho da medicina. 

Hoje, após mais de 100 anos, as mulheres são a principal força de trabalho da saúde. No Brasil, elas representam 65% dos mais de 6 milhões de profissionais no setor público e privado. Segundo o Censo do IBGE, em algumas carreiras, como fonoaudiologia, nutrição e serviço social, elas alcançam quase a totalidade dos cargos, ultrapassando até 90% de participação. Em outras, como enfermagem e psicologia, os percentuais passam de 80%. 

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Embora os dados acima sejam referentes ao Brasil, no restante do mundo não é muito diferente. Principalmente durante a pandemia de Covid-19, ficou clara a predominância feminina na linha de frente do enfrentamento à crise sanitária. De acordo com o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), em nível global, cerca de 70% das equipes de trabalho em saúde e serviço social são compostas por profissionais do sexo feminino, incluindo – além de médicas -, enfermeiras, parteiras e trabalhadoras de saúde da comunidade

Monica Calazans, enfermeira e primeira pessoa vacinada contra Covid-19 no Brasil, faz parte dessa estatística. No Hospital das Clínicas, em São Paulo, ela viveu na pele a angústia de lidar com uma doença desconhecida, sem procedimento certeiro para a cura. “Era uma doença grave, isso a gente sabia. Mas como lidar? Cada paciente apresentava um quadro diferente, com gravidades e evoluções distintas. Esses pacientes eram caixinhas de surpresa. Não sabíamos como iam evoluir. Ficávamos sempre com o pé atrás”, recorda. “A Covid-19 veio para sabermos até que ponto temos equilíbrio emocional nesse cuidado com as pessoas. Para nós, conseguir tirar um paciente da UTI era um verdadeiro troféu.” 

Apaixonada pelo ato de cuidar das pessoas, é com a melhora de seus pacientes que Monica recarrega as energias e lida com as dificuldades da área de saúde. Afinal, embora as mulheres tenham conquistado seus espaços, o setor não é um mar de rosas – a começar pela desigualdade de gênero no alto escalão. Lá, onde as decisões mais importantes são tomadas, poucas mulheres estão presentes: apenas 20% do comitê de emergência da Organização Mundial de Saúde (OMS) e apenas um quarto dos decisores nos governos centrais são mulheres, como aponta um estudo realizado em 30 países pelo grupo Women Deliver, de Nova York, em parceria com a organização francesa de pesquisa Focus 30. 

Já no Brasil, uma pesquisa do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), publicada pela revista “British Medical Journal”, mostra que quase 80% das mulheres médicas estão concentradas nas categorias salariais mais baixas, enquanto 51% dos homens médicos estão nas categorias mais altas. O estudo também revela que, no setor, os especialistas homens tendem a ocupar posições de liderança com mais frequência do que profissionais mulheres. 

Como se a desigualdade não fosse o bastante, Monica também ressalta a necessidade de um olhar mais atencioso para as mulheres da saúde. “Eu fui valorizada quando me escolheram para ser a primeira pessoa a se vacinar contra a Covid-19 no Brasil, mas precisamos de mais do que isso. Falta os dirigentes olharem para questões como piso salarial, carga horária e condições precárias de trabalho em alguns locais do Brasil. Sabemos que, em nível nacional, ainda precisamos de um olhar carinhoso. As mulheres carregam o ato de cuidar em sua essência, mas também precisam de valorização e apoio.” 

E Monica faz questão de atrair outras mulheres para o setor. Para ela, é a partir da voz ativa que mais mulheres vão conquistar seus espaços. 

Para honrar a luta da enfermeira – e de todas as profissionais de saúde do país -, fizemos uma seleção de 10 mulheres que mostram a força do protagonismo feminino na saúde. Veja, a seguir, quem são elas:

Adriana Melo

Adriana Melo (Foto: Divulgação)

Adriana Suely de Oliveira Melo é considerada a primeira médica que fundamentou e apresentou provas concretas sobre a relação do vírus Zika com a microcefalia, em 2015. Especialista em saúde materno-infantil, a médica obstetra paraibana percebeu, durante sua rotina de atendimento às gestantes na cidade de Campina Grande, localizada no sertão paraibano, que mulheres contaminadas pela Zika no primeiro trimestre de gestação geravam bebês com microcefalia. 

A partir deste indício, foram realizadas pesquisas científicas que constataram a presença do vírus da Zika no líquido amniótico de duas gestantes, cujos fetos desenvolveram microcefalia. A descoberta de Adriana foi anunciada em um artigo científico publicado na revista “Lancet” em janeiro de 2016. Formada em medicina pela Universidade Federal de Campina Grande, hoje a médica também atua como presidente do Instituto de Pesquisa Professor Joaquim Amorim Neto (Ipesq), uma organização sem fins lucrativos que investe em pesquisas científicas sobre as consequências de longo prazo em crianças com microcefalia e síndrome congênita da Zika.

Dara Ramires Lemes

Dara Ramires Lemes (Foto: Divulgação)

Nascida e criada na aldeia indígena Te’yikue, na cidade de Caarapó, no Mato Grosso do Sul, a jovem índia Dara Ramires Lemes, de 25 anos, tornou-se a primeira médica de aldeia do estado, alcançando o seu sonho de infância. Além disso, Dara se destaca na região por um fato ausente do conhecimento da maioria dos médicos do país: ela fala guarani. Para a médica, esse contato com suas origens é muito importante na hora de exercer seu ofício, visto que muitos pacientes indígenas se sentem mais confortáveis em suas consultas por conta do sentimento de pertencimento e representatividade. 

Jurema Werneck

Jurema Werneck (Foto: Divulgação)

Assim como Luana Araújo, Jurema Werneck foi uma das fortes vozes a depor na CPI da Covid no ano passado. Referência em direitos humanos, a médica é a atual diretora-executiva da Anistia Internacional Brasil, além de ativista do movimento de mulheres negras. Em seu depoimento ao Senado, apresentou um estudo que demonstrou que cerca de 120 mil vidas poderiam ter sido poupadas em 2020, primeiro ano de pandemia, se o governo brasileiro tivesse adotado de forma mais assertiva as medidas preventivas, como distanciamento social, restrição a aglomerações e fechamento de escolas e do comércio.

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Além de denunciar a negligência do governo federal, ela também pontuou o quanto a pandemia afeta de modo desigual os brasileiros, destacando que, mais uma vez, em decorrência das históricas desigualdades sociais, os negros estão entre os mais afetados pela doença.

Katleen Conceição

Katleen Conceição (Foto: Divulgação)

Ao seguir os passos de seu pai, que também era médico dermatologista, Katleen Conceição sempre teve a certeza de que seu caminho seria na área da saúde. O que ela não tinha ideia, no entanto, era o tamanho da importância que sua atuação teria na vida das pessoas. Durante um cargo temporário no Hospital do Exército, em 2003, ela teve a primeira percepção sobre esse impacto. “Virei professora e passei a atender pacientes brancos e negros, mas começaram a mandar muitos negros. Um dia, perguntei a um deles o porquê e ouvi a seguinte resposta: ‘Eles dizem que a senhora deve saber mais sobre pele negra por ser negra também’. Eu era uma referência para aquelas pessoas”, lembra a médica. 

A partir desse curioso acontecimento, Katleen resolveu  estudar nos Estados Unidos e na Europa para se aprofundar na dermatologia focada em peles negras. Após muito estudo e contato com outros profissionais ao redor do mundo, tornou-se a primeira mentora brasileira do Skin Color Society, grupo norte-americano de pesquisadores que estudam apenas pele negra e patologias associadas a ela. A partir disso, também ganhou destaque em atendimentos no Brasil. Hoje, é conhecida por atender clientes como Lázaro Ramos, Taís Araújo, Cris Vianna, Hugo Gloss, Isabel Fillardis, Juliana Alves, Cacau Protásio e Roberta Rodrigues. “Transformar vidas e perspectivas por meio da autoestima e fazer as pessoas enxergarem que podem ser e ocupar qualquer espaço é um presente de Deus”, diz a médica, que sonha em abrir uma ONG para tratar pessoas gratuitamente. “Ser uma referência de mulher negra na saúde é uma benção.”

Luana Araújo

Luana Araújo (Foto: Divulgação)

Durante um dos depoimentos da CPI da Covid-19 no Senado, a atenção se voltou para a mineira Luana Araújo, médica infectologista que chegou a exercer – por 10 dias – o posto de secretária de enfrentamento à pandemia no Ministério da Saúde, mas foi demitida por motivos até hoje nebulosos. Durante o depoimento, Luana falou sobre a ineficácia do uso de medicamentos como cloroquina, hidroxicloroquina e ivermectina, além de ressaltar a importância da testagem em massa no combate à pandemia. 

Crítica do tratamento precoce contra o coronavírus, Luana se formou médica especialista em doenças infecciosas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), possui mestrado em saúde pública pela Universidade Johns Hopkins Bloomberg, nos Estados Unidos, e é a primeira brasileira a receber a prestigiada Bolsa Sommer (Hopkins Sommer Scholars Program), programa que leva o nome do epidemiologista norte-americano Alfred Sommer e que reconhece estudantes com excelência acadêmica.

Margareth Dalcolmo

Margareth Dalcolmo (Foto: Divulgação)

Margareth Dalcolmo se formou em medicina em 1978, pela Escola Superior de Ciências da Santa Casa de Misericórdia de Vitória (EMESCAM). Sua residência médica foi realizada na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), com foco em pneumologia – onde começou sua atuação de destaque. Estudiosa da tuberculose, foi uma das pioneiras na luta contra o tabagismo no país e é autora de 16 capítulos de livros médicos e de cerca de 70 trabalhos publicados em revistas nacionais e internacionais. 

Durante a pandemia de Covid-19, ganhou papel de destaque, sendo considerada uma das principais especialistas em doenças pulmonares no país e tornando-se participante ativa dos principais telejornais e programas brasileiros, com o intuito de alertar a população dos riscos da doença e difundir a ciência. Após tantos anos estudando o trato respiratório, Margareth teve uma atuação fundamental em um momento crítico para a saúde pública.

Mariângela Simão

Mariângela Simão (Foto: Divulgação)

Formada em medicina pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), Mariângela Batista Galvão Simão decidiu, logo no início de sua carreira, que dedicaria o seu trabalho ao campo da saúde mais sensível aos impactos sociais: a saúde pública. Desde então, começou a se destacar como sanitarista e ocupar cargos públicos em diversos órgãos, como as secretarias de saúde – municipal e estadual – de Curitiba, onde ajudou na implementação e regionalização do Sistema Único de Saúde (SUS).

Em 2004, após ganhar renome por sua atuação em Curitiba, Mariângela começou a trabalhar no Ministério da Saúde com o  propósito de atuar no departamento internacional de combate à Aids – setor que logo depois se voltou também ao cuidado de outras doenças sexualmente transmissíveis. Em 2020, aos 64 anos, a médica parecia contar com um currículo vasto o bastante para lidar com qualquer crise de saúde pública – ela apenas não contava com a pandemia de Covid-19. 

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Como diretora-assistente da área de medicamentos e produtos de saúde da Organização Mundial de Saúde (OMS), pela primeira vez Mariângela encarou o desafio de combater uma doença de fácil e rápido contágio, que se alastrou para uma crise sanitária mundial. Seu papel, durante todo o período, foi focar na garantia de acesso a fármacos e vacinas em pesquisa para países menos favorecidos economicamente, por meio de políticas e acordos de uso equitativo. Atualmente, é vice-diretora geral da OMS.

Monica Calazans

Monica Calazans (Foto: Divulgação)

Monica Calazans começou a trabalhar em ambientes hospitalares em 1985, como funcionária da área administrativa. No Hospital das Clínicas, em São Paulo, tinha contato direto com o setor da saúde, mas nunca tinha pensado em atuar como médica ou enfermeira. “O ponto de virada foi quando eu estava andando pelos corredores e um paciente me pediu um copo d’água. Essa não era a minha função, e foi aí que eu percebi o quanto o meu papel no hospital estava limitado e o quanto eu podia oferecer a mais para as pessoas”, conta. De um copo d’água, que ajudou na sede momentânea de um paciente, Monica ganhou força para seguir sua intuição e se matriculou em um curso de auxiliar de enfermagem. “Com o tempo, acabei me apaixonando. Após finalizar o curso, fiz a graduação e me formei como enfermeira em 2011.” A paulistana, moradora de Itaquera, na zona leste da capital, se encontrou nas UTIs e nos pronto atendimentos, fazendo dos corredores o seu espaço de cuidado. Hoje, aos 55 anos, em busca de melhores condições para o setor da enfermagem, também se filiou ao MDB e é pré-candidata à Câmara dos Deputados.

Nicole Silveira

Nicole Silveira (Foto: Reprodução Instagram)

Durante os Jogos de Inverno de Pequim, em fevereiro, a atleta Nicole Silveira, de 27 anos, fez história ao conquistar o melhor resultado do Brasil na disputa do skeleton feminino – um esporte que consiste em descer pistas de gelo sinuosas sobre um trenó. Nicole ficou em 13º lugar na modalidade e teve o melhor desempenho do país em esportes de gelo, além de se tornar a melhor da América Latina na história da categoria. A conquista, é claro, foi um grande marco, mas a vida de Nicole por trás dos campeonatos também merece holofotes. 

Nascida no Rio Grande do Sul, Nicole mora em Calgary, no Canadá, desde os sete anos, e é lá que ela divide o seu tempo entre o esporte e a enfermagem. Quando não está dançando, praticando ginástica artística, vôlei, fisiculturismo, levantamento de peso, futebol ou skeleton – são tantos esportes que a brasileira já pode se considerar uma multiatleta -, ela atua na área da saúde. Durante a pandemia de Covid-19, Nicole trabalhou na linha de frente de combate à doença, dedicando boa parte do seu tempo para o setor, que precisava do máximo apoio possível.

Silvia Regina Brandalise

Silvia Regina Brandalise (Foto: Divulgação)

Silvia Regina Brandalise, fundadora do Centro Infantil Boldrini, é uma das pioneiras da oncopediatria no Brasil e do combate ao câncer infantil. Em 1978, quando o tratamento de leucemia ainda era muito atrasado no Brasil, ela lutou com unhas e dentes para que houvesse um espaço adequado, eficaz, justo e gratuito para as crianças – de forma resumida, essa é a origem do Centro Infantil Boldrini, que hoje é referência mundial no combate à doença. Formada pela Escola Paulista de Medicina, Silvia já recebeu mais de 120 prêmios nacionais e internacionais em reconhecimento ao seu trabalho como médica e pesquisadora.

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